Publicado por Durval em
Estes dias encontrei pessoas que não via há algum tempo e fui surpreendido por estranhos questionamentos sobre opiniões que manifesto nas redes sociais.
Elas teriam ouvido falar que eu virei militante do PT, que doei dinheiro ao partido e até que eu teria assumido um cargo público numa secretaria municipal (e quem disse isso me garantiu que não estava zoando da minha cara!). Me perguntaram se eu odiava os EUA. Me aconselharam, com boas intenções, a não expor opiniões tão "radicais", porque precisamos "manter as portas abertas".
Aos que me questionaram, espero ter respondido ao vivo, mas como a confusão nasceu na rede e eu não pude falar com as pessoas que falaram com as pessoas com quem eu falei, deixo este esclarecimento aqui a quem interessar.
Reconheço que minha atual visão política é um tanto diferente da visão predominante nos meus círculos sociais da vida real, majoritariamente compostos por pacatos cidadãos da classe média paulistana tentando levar suas vidas de forma honesta e digna. Mas pelo jeito alguns andam tão ocupados que não conseguem lidar com nuances e se apressam em colocar tudo que não é branco na gaveta mental dos pretos.
Presumo que a "militância petista" que alguns têm me atribuído advém do fato de eu não prejulgar toda e qualquer iniciativa do partido como automaticamente negativa, como é comum ver na minha timeline. Ou então por ter declarado meu voto em Fernando Haddad e aprovar seu governo até agora. Acho que ele tem tomado iniciativas corajosas e sensatas em relação a muitos assuntos, que não cabe detalhar aqui.
Mas daí a me classificar como militante e até integrante do PT, vai uma longa distância. Não sou nada disso nem nunca manifestei nenhuma opinião que justificasse tal conclusão. Tenho críticas ao governo federal, discordo de muitas ações da Dilma, não sou dos que acreditam que os condenados do mensalão são vítimas das elites golpistas, mas não é por isso que vou aderir a maniqueísmos simplistas e ignorar os acertos do governo.
No meio da polarização irracional que joga "tucanalhas" para a direita e "petralhas" para a esquerda, quando talvez eles estejam mais próximos uns dos outros do que querem as torcidas de ambos os times, me parece que os partidos perderam muito da sua função de porta-vozes de ideologias e princípios para se transformar em instrumentos fisiológicos de defesa de interesses próprios. Estou junto com a massa que se declara sem partido. Mas não gosto de anular meu voto, então procuro escolher candidatos mais em função de suas trajetórias e currículos pessoais do que por seus vínculos com legendas, mesmo sabendo que ninguém governa sozinho.
Já votei no FHC e no Lula e acho que fiz as opções corretas nos dois casos, diante da conjuntura e das escolhas que então se apresentavam. Como muitos, hoje eu gostaria de ver a nação sendo conduzida por outras pessoas, com ideias mais arejadas e corajosas. Mas a oposição me parece mais perdida que o governo e está desperdiçando oportunidades de se impor. Costumo prestar atenção aos pronunciamentos do FHC, sempre propositivos e inteligentes (curiosamente, ele respeita mais o Lula do que muitos dos seus fãs). Mas acho que ele não conseguiu deixar nenhum herdeiro à altura. O que eu vejo no seu partido é o velho nhenhenhém eleitoreiro de sempre, o rabo tão preso e as mãos tão sujas quanto os outros. Portanto ainda não decidi em quem votar e sinceramente não descartei nenhuma opção. Pretendo exercer meu direito à dúvida, que considero saudável, até a hora que for necessário (frequentemente até a véspera da votação).
Sobre "odiar os EUA", vejo apenas como outra manifestação da mesma necessidade preguiçosa de simplificar a realidade para ter a ilusão de compreendê-la. Eu devo ter criticado os EUA em postagens sobre a Síria e a Palestina, mas é óbvio que isto não significa odiar um país inteiro. Não deveria ser tão difícil distinguir entre crítica e ódio (e entre uma política de Estado e seus habitantes) e lamento que certas pessoas sejam capazes de me atribuir tamanho preconceito.
Quanto às minhas opiniões "radicais", tentei listar abaixo as que poderiam ser classificadas assim pelos meus conselheiros ultramoderados. Se você acha que são opiniões radicais, então sim, eu sou radical:
- Os veículos da mídia freqüentemente manipulam e falsificam os fatos para favorecer seus aliados. Tanto os grandes quanto os pequenos, mas os grandes fazem mais estrago. Não parei de ler a Folha e o Estadão (a Veja, não dá!), mas leio TAMBÉM a Revista Fórum, o Opera Mundi, NY Times, El País, The Guardian, Haaretz, blogs, mídias ninjas etc. Dá mais trabalho diversificar as fontes, mas é uma forma de garantir uma visão da realidade minimamente confiável.
- A polícia está visivelmente em crise e despreparada para lidar com as manifestações de rua, tem agido com violência injustificável contra os cidadãos honestos (não só nas manifestações) e contra os bandidos, está pondo em risco a democracia e desrespeitando direitos humanos.
- Criminosos, assim com Rachel Sheherazade, são humanos.
- O sistema judiciário, com todas as suas falhas, é preferível à justiça pelas próprias mãos.
- A meritocracia, embora seja um critério importante de ascensão social, sozinha não é capaz de reverter injustiças históricas e deve ser complementada com medidas assistenciais.
- A melhoria das nossas cidades passa necessariamente pela diminuição da parcela absurda de espaço público que hoje é destinada exclusivamente aos automóveis.
- O objetivo real dos bombardeios que EUA e aliados promovem regularmente há décadas não é o alegado combate ao terrorismo ou a defesa de populações contra ditadores sanguinários.
- Israel é um estado onde impera o Aparthied.
- Detesto catupiry.
Eu poderia incluir outras opiniões "radicais" na lista, mas vamos ficar somente com as que eu já comentei nas redes, para não chocar os corações mais delicados. Estou ciente de que expressá-las pode me "fechar portas", mas também pode abrir outras, para lugares onde eu vou me sentir mais satisfeito de estar. Além do mais, alinhar-se com o pensamento de seus pares não garante imunidade contra os radicalismos, que às vezes estão muito bem dissimulados entre os consensos. E estes podem ser os mais destrutivos.